Quantas pedrinhas preciso jogar
ao longo da floresta para um dia, quem sabe, encontrar o caminho de volta para
casa? Quantas micro lembranças de quem fui se perderam para que eu conseguisse
chegar a quem estou? O verbo ser foi deixado do lado de fora da caixa, que se
tornou um cubículo de repressão do verbo estar, conjugado na primeira pessoa do
singular. Cada vez menor, ela não tem dado conta de guardar um volume que
constantemente sente vontade de escapar.
O riso frouxo e a
espontaneidade foram as primeiras pedrinhas deixadas para trás, junto dos
cabelos ruivos com a nuca tingida de cor-de-rosa. Em uma autoenganação
constante de que seria ne cessário entrar no cubo e que um dia acostumaria com as suas dimensões. Acontece que eu, que nunca fui claustrofóbica, começo a sentir falta de ar e suspeitar que não caibo mais.
As metáforas nas pontas dos
dedos foram substituídas por jargões formais e os neologismos deram lugar à
repetição. O sentimento de ser única no mundo, em minhas nuances e sonhos que
nunca conheci, evaporou. As crises existenciais da adolescência, despejadas
sempre no mesmo lugar, no entanto, ainda estão aqui. O que sei é que, a cada
dia que passa, tenho mais receio de expor as metáforas, em qualquer lugar que
seja.
Quanto mais intimista essa
prosa fica, menos chances tem de ser lida por alguém. Ela deve ficar fora da
caixa, em um lugar que ninguém conhece. Quanto mais distante da caixa, mais
íntimo, porque dentro dela cabe apenas a versão robotizada e calculada de
alguém que num dia longínquo sonhou fazer a diferença. Na ânsia de alçar voos
compatíveis com o tamanho de minhas asas, nem percebi quando foi feita a poda.
Agora, como uma calopsita, não estou presa na gaiola, mas também não consigo
voar longe como um dia imaginei. E lá se foram dez anos.
Quanto da gente a gente perde
pelo meio do caminho? Mesmo sem saber o destino, ou fingindo que sabemos, mas
tropeçando cada vez mais nos galhos secos e pedras, sem folhas caídas para
amortecer a queda. Quando acabaram as pedrinhas, comecei a jogar migalhas de
pão para achar o caminho de volta, mas os passarinhos comeram e não consigo reencontrar
a trilha. Talvez seja um caminho sem volta e a vida realmente seja estar
perdido na floresta andando em círculos. Não haverá reencontro, nem volta para
casa. É a vida real. A casa nova é aqui, agora, entre quatro minúsculas paredes
de doces tão apetitosos quanto enganosos, porque o resto dessa fábula todo mundo
já conhece.
Mais uma crise existencial para a história desse blog que,
em maio de 2020, completou 10 anos.
Considero este um texto comemorativo à década do
De Boa com Debora.
De Boa com Debora.
