domingo, 25 de maio de 2025

Hipérbole

 

No meio da madrugada, sentado à beira da cama, agarrou minha cintura e disse bem baixinho e olhando nos meus olhos:

“Promete que volta?”

“Volto quando, doido?” – e ri.

“Sempre.”

“A gente vai se ver amanhã, e prometo que volto amanhã.”

Na minha tentativa de ser honesta e dizer que queria voltar, mas “sempre” era muito tempo para prometer (especialmente no primeiro dia), escolhi as palavras certas para a profundidade do diálogo (que me arrancou um sorriso suave de canto de boca após ele fechar a porta, acompanhado dos cutucões dos anticorpos que tenho por já estar vacinada).

Vivo em hipérbole e assumi que sou desse jeito. Por ser assim e por já ter escrito umas tantas histórias de amor falidas (minhas e inventadas), consigo identificar quando as palavras são vãs quando ditas por um homem solteiro – e normalmente não ligo quando o são, acho satisfatória a sensação de, sabendo que a armadilha foi feita, desarmá-la e depois desaparecer por mim mesma, levando comigo somente uma boa história que eu mesma roteirizei e vou contar ao meu punhado de amigos em forma de tragicomédia.

A gente cresce achando que tem que ser escolhida e é deliciosa a epifania de descobrir que, na verdade, sou eu quem escolhe (e, se der sorte, posso ser escolhida de volta). Essa descoberta me permitiu continuar vivendo com a intensidade que minhas conexões neurais imploram, mas guardar meu eu de verdade para quando – e se – houver intimidade. Por isso, adoro narrar as histórias vividas com homens que nunca mais verei, talvez porque nunca me pediram pra voltar, mas, principalmente, porque eu nunca quis.

Aquele diálogo à meia-luz, no entanto, me parecia perigosamente sincero – em que pese a inegável hipérbole, porque “sempre” é mesmo muito tempo. O cinismo da prematuridade flerta com os românticos, porque vez ou outra a gente cogita voltar a acreditar que os astros se alinham e haverá alguém para cantar a segunda voz em Dueto de Chico Buarque. Tudo, em que pese hipnótico, não passa de um bom diálogo a ser transcrito em crônica.

Assim como o dia em que atravessei a Avenida Paulista de patinete à meia-noite, abraçada na cintura de um irlandês, da Consolação à Brigadeiro Luis Antonio, rindo e dizendo a ele que iríamos morrer; ou o dia em que bati o martelo de que aceitaria sair com um documentarista porque queria muito ouvi-lo falar sobre o Modernismo brasileiro, tema que me tira dos eixos e eu adoro gente inteligente; ou o dia em que o professor de direito penal me levou para conhecer as cachoeiras de Goiás, num domingo que passei por Brasília; ou outras tantas histórias que vivi para escrever, ou escrevi porque escolhi viver daquele jeito, capturada pelo momento e captando todos os detalhes.

No dia seguinte, apesar de termos nos encontrado, só não cumpri minha promessa de voltar por razões alheias ao planejado. Ele me deixou em casa e, ao se despedir, perguntou:

“Te vejo durante a semana?”

“Quantas vezes?” – fiz uma provocação, pra ver a reação e testar a sagacidade da resposta.

“Uma: você vem e fica.”

O homem é bom em exageros e respostas inusitadas, e agradeço a ele pelo material para a escrita, em que pese o futuro tenha se revelado como o esperado. Talvez meu viver em hipérbole seja tão passageiro e intenso quanto o vento, que passa levantando os pelos dos braços, mas uma hora ou outra vai embora, porque nenhum lugar lhe cabe e ainda não apareceu alguém capaz de lidar com os reboliços que ele é capaz de causar. O vento: hiperbólico, infinito em si mesmo e convictamente desacompanhado – e tão poético quanto tudo isso.

sábado, 10 de maio de 2025

Umami

 

Trajada com o clássico biquíni rosa pink, camisa de botão listrada rosa com branco e usando um chapéu de palha que finge certa elegância, tomava a quarta cerveja sozinha, embaixo do guarda-sol, na Praia da Barra em Salvador. Experimentava aquela ótima sensação de estar quase bêbada, em que as pontas dos dedos ficam mais sensíveis e os sorrisos ficam mais fáceis. Foi quando, por coincidência ou oportunidade, passou um andarilho e se ofereceu pra tirar meu tarot por cinquenta reais. À beira da boemia, a carteira também se abre mais fácil. Topei a leitura de tarot, ansiosa por um spoiler que me deixasse satisfeita (e indicasse, pelo menos, que em algum momento eu me encaixaria em algum lugar e me encontraria nessa vida).

O cara desconhecido pegou o baralho, distribuiu as cartas na areia e se pôs a falar várias coisas sobre meu signo e meu comportamento, de um jeito genérico o suficiente pra eu me identificar, mas sagaz o bastante pra eu não perceber que era tão genérico (e achar que fazia parte do misticismo falar trocando a ordem das frases). Mestre Yoda já havia ensinado essa lição, então alguma coisa de sábio o leitor de tarot tinha, nem que fosse a malandragem. Em resumo, a mensagem que ficou é que eu mudaria de cidade, seria uma senhorinha muito rica, mas nunca encontraria um amor para a vida. Seduzida por ideias que já não fazem sentido aos meus trinta anos, me dei por satisfeita e aceitei as conclusões.

Hoje, após mudar de cidade e vivendo uma solitude umami, experimento um certo receio de que ele tenha acertado sobre a minha vida amorosa. Muito embora eu tenha aprendido os caminhos para me bastar, cresci assistindo a comédias românticas clichês e precisei passar por um longo processo de autoconhecimento pra assumir quereres que contradizem a satisfação que senti com a leitura do tarot: o de encontrar o amor por aí, daqueles que eu descreveria como a intimidade de um café da manhã em casa, num domingo qualquer. O amor, após um artigo definido e para usar carinhosamente pronomes possessivos, sem precisar de plural. Daquelas histórias de amor que crescem e amadurecem como as orquídeas: às vezes florido, às vezes sem flores; mas sempre lá, vivo, desde que receba cuidado e atenção. A metáfora não é minha, mas guardei após ser dita por um jardineiro.

Há, no entanto, um quebra-molas em minha frente. Descobri que sou diferente e, por sê-lo, também amo diferente. Por isso, como um filhote de gato abandonado e escondido atrás da roda de um carro, os pêlos da coluna se arrepiam ao pensar em me aventurar de novo. A tentativa é sempre insegura, o que define os rumos da narrativa é a atração ou aversão ao risco (que o animal arisco, quando domesticado, ignora). As diferenças que me fazem sentir tudo tão intensamente talvez sejam as que me afastam de viver uma história de amor em que a mesma quantidade de carros transita pela via de mão dupla, e são justamente elas que me causam o medo do improvável. Acostumada a bradar as músicas de Maria Bethânia sozinha em casa e a apostar muito, muito alto, não posso ignorar o processo de autoconhecimento inerente à solitude e ao amadurecimento que o momento exige.

Talvez seja esse o plot que o cara do tarot de Salvador não revelou: eu me guardaria em uma redoma de vidro, com flores lindas de serem admiradas, mas delicadas demais para enfrentarem os voos das abelhas e borboletas. No fundo, torço pra que ele seja simplesmente um místico fanfarrão e eu apenas uma bêbada idiota que perdeu dinheiro, em que pese o curso da história venha mostrando o contrário e Bethânia sussurre prudência na caixa de som sob a luz amarela da luminária neste sábado à noite em casa.

sábado, 3 de maio de 2025

Parco detalhe

 

Eu já passei por essa esquina um milhão de vezes. Dirigindo, a pé, de carona, no ônibus, por debaixo da terra, voando, invisível... Já passei por aqui e, apesar de achar que já tinha visto de cabo a rabo todos os arbustos distribuídos por ela, eu sabia que faltava alguma coisa para que fôssemos verdadeiramente íntimas. Foi aí que na terça-feira à noite, entre o expediente do dia e o que se alongaria pela madrugada, ouvi com todas as letras a palavra que explicava as percepções que vivenciei todas as vezes que passei pela avenida (e por todos os cantos em que pus os pés).

Foi como um raio caindo em minha cabeça, uma explosão de luz que explicou minhas sombras, até mesmo aquelas sobre as quais eu nunca tinha ouvido falar, mas as sentia intensamente, numa confusão de pensamentos emaranhados que se atropelam a vida inteira, competindo pela minha atenção e interesse, enquanto desejo poder fazer o infinito nesta única existência que ganhei de presente.

Os dias que vieram em seguida foram acompanhados da consciência após o lampejo: tudo agora fazia sentido naquela avenida, e foi por isso que eu revisitei as memórias de cada centímetro de calçada e de asfalto, prestando atenção em cores que não sei o nome, como Adriana Calcanhotto em Esquadros. Eu quero chegar antes, pra sinalizar o estar de cada coisa, fazer prosa sobre o pouco que muito me comove, enquanto tento alcançar meus simultâneos e incansáveis pensamentos que buscam propor um prognóstico dos porquês de eu finalmente entender que não me caibo. Não foi uma escolha, sou deveras e transbordo.

A sinfonia das buzinas para os carros em fila dupla; o casal sentado no boteco que serve prato feito, se deliciando em sorrisos ao encontrar um sintoma de novo amor aos tantos anos; o barulho dos sacos de lixo se movimentando pelo vento das pessoas passando ao lado; o pai que segura na mão do filho miúdo e explica que pra atravessar a rua é preciso passar pela faixa de pedestres. Cada parco detalhe é especial. Observo tudo ao mesmo tempo e guardo o que seria inútil, mas fica bonito quando coloco em formato de história. Absorvo profundamente, como uma overdose da minha sensibilidade e que não escolhi viver: simplesmente sou, simplesmente vejo, simplesmente escrevo. Como que para sobreviver a mim, mas também para conseguir respirar nesse mundo, que me parece tudo e tanto desde sempre.

Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela, quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle

sábado, 5 de abril de 2025

Bucha

 

Em mais um dos devaneios sobre a decoração dos poucos metros quadrados que me cabem no inflacionado mercado imobiliário de São Paulo, decidi que queria tirar a televisão do rack verde da sala e pendurar na parede do quarto, bem em frente à cama. Peguei emprestada a furadeira do zelador do prédio e decidi eu mesma fazer o serviço, autoconfiante de que tinha aprendido a manusear a ferramenta adequadamente quando um dos homens que passou pela minha vida me ensinou.

Uma barulheira danada, o pó voando no meu rosto e era preciso colocar muita força nos braços pra broca conseguir perfurar o azulejo e alcançar a parede... Era meio cena de filme segurar a furadeira enquanto ele apoiava meus cotovelos e direcionava o que  eu deveria fazer – e sou adepta de roteirizar minhas comédias românticas. A verdade é que naquele dia usei só pra fazer charme, mas deixei o resto do trabalho com ele: fiz apenas um dos quatro furos da cantoneira do banheiro. Satisfeitíssima por ter vivido uma cena clichê e por ter aprendido uma nova habilidade (preciso saber que posso fazer sozinha, mas não tenho problema em deixar fazerem o trabalho pesado por mim).

Fechando os parênteses que contextualizam a história, voltemos à televisão no quarto. Era um dia qualquer, daqueles em que a minha cabeça corre meia maratona sem preparo físico, enquanto eu fico sentada em frente ao computador resolvendo o que tiver que resolver. Num ímpeto de hiperatividade, decidi que só o que seria capaz de acalmar meus nervos era pendurar a televisão no quarto (como se não fossem suficientes os ansiolíticos).

Medi tudo com a trena, marquei com lápis onde deveria furar e mãos à obra. Foi um rátatatá como na música dos Engenheiros do Hawaii, encaixei as buchas nos furos, fixei os respectivos parafusos e voilà: coloquei o suporte na parede. Suada e descabelada, mas muito faceira pela minha aclamada autossuficiência. Ao acomodar a televisão, tive a dramática surpresa de que qualquer filme me causaria torcicolo, já que a TV estava torta como a Torre de Pisa.

Fiquei irritada, mas decidi que botaria a televisão reta num outro dia, porque naquele eu precisava resolver um bocado de outras coisas e sequer tinha brocas sobrando para novos furos. Deixei a furadeira do zelador no chão do quarto, interfonei explicando a situação pra ele e pedi um pouquinho de paciência.

Três semanas se passaram e não comprei novas brocas, pois estive submersa nos outros problemas rotineiros da vida: gripe inesperada; cachorro com tosse de madrugada; idas ao supermercado porque não antevi que o básico ia acabar; cozinhar o almoço da semana pra não comer fora todo dia; lavar a roupa antes que acumule; estar sempre de unhas feitas e não cair na tentação de roer por causa da ansiedade; pintar o cabelo sozinha com tinta de farmácia num surto de domingo; resolver a resistência do chuveiro que queimou do nada; a cafeteira que quebrou e atrasaram pra entregar a nova; estar presente na vida dos amigos pra eles não acharem que fui abduzida; levar o cachorro pra passear... tudo isso enquanto tento não deixar de ler por prazer, marco yoga aos domingos (e falto alternadamente), faço mesversário de pagamento da academia sem dar as caras um dia sequer, tento manter minimamente uma dieta e faço de tudo pra nunca estar amarrotada.

Três semanas depois, desisti de ajeitar a TV. Devolvi a furadeira pro zelador e aceitei que ela vai ficar torta. A minha unha está pintada, mas a do mindinho quebrou. Eu passei toda a roupa, mas a bolsa pesada no ombro amassou a camisa de seda. Usei maquiagem e continuei com cara de cansada, saí com antecedência e me atrasei por causa do trânsito... A infinita tentativa de equilibrar perfeitamente os pratos e a constante falha de deixá-los cair na minha cabeça e me frustrar logo em seguida, acompanhada da sensação de que alguém poderia ter ido comprar as três brocas que eu precisava e eu resolveria facilmente o problema da TV torta.

A questão é que não há um alguém sobressalente pra resolver as pequenezas do dia a dia por mim, especialmente por viver longe dos meus na cidade em que a música popular brasileira não cansa de cantar solidão. Nem tudo é entregue por delivery, outro dia gastei quarenta só porque precisava de um adaptador de tomada com urgência. Chico cantou que “tem nada como um tempo após um contratempo”, mas tem épocas em que a vida inteira acaba sendo um contratempo. Resta aceitar a TV inclinada, a camisa amassada, a minha insuficiência e imperfeições que, honestamente, têm mais charme, autenticidade e bagagem do que meus antigos e enganosos discursos dizendo que me basto. Eu não me basto – e sou feliz por finalmente ter vivido essa dolorosa epifania.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Tautologia

Outro dia, conversava com uma amiga sobre a possibilidade de pular de paraquedas e, numa noite qualquer em casa, me flagrei pesquisando a logística e o orçamento necessários pra irmos até Boituva encarar a aventura. A busca por dopamina daquelas que viram ótimas histórias pra contar, seja pela sensação indescritível de cair no invisível e ter como amortecer o pouso admirando a vista depois de acionar a frenagem da descida, seja pelo trauma por talvez ter ultrapassado o próprio limite nas experiências radicais.

Em mais uma das minhas infinitas reflexões sobre amor, enquanto simultaneamente sou espectadora de histórias improváveis que acabam sendo bem-sucedidas e de ser o ombro amigo após tristes fins de romances que faliram, concluí o óbvio: se entregar à resistência do ar é correr riscos, o que pode terminar muito bem ou terrivelmente mal. O fato é que a escolha de pular de paraquedas é, sobretudo, optar corajosamente por encarar as infinitas possibilidades do amor e do horizonte.

No avião, a aproximadamente dez mil pés do chão, com a mochila nas costas, dei cinco passos pra trás e me sentei no banco, a garganta trancada de medo pelo risco que assumi quando pulei da última vez. Ao mesmo tempo, um sussurro no ouvido me dizia que talvez valesse a pena tentar de novo. Estava completamente fechada para balanço, mas tenho essa mania crônica de ouvir o que meu coração tem a dizer, a despeito da racionalidade que necessariamente imprimo em minhas escolhas (apesar de não parecer, porque quem olha pro céu e me vê descendo a 200 km/h pensa que simplesmente fechei os olhos e pulei).

É preciso encarar as próprias vulnerabilidades antes de reconhecer a nossa coragem de enfrentá-las, porque às vezes o adequado para o momento é simplesmente tirar a mochila das costas e esperar o avião pousar em segurança. Não precisamos estar sempre prontos para pular. Recuperar o fôlego e se recompor da última aventura também faz parte do salto, mesmo que ele não ocorra.

Ainda ali, sentada processando minhas reflexões, um rosto há muito conhecido sentou ao meu lado, também com a mochila nas costas e mais uma série de receios que resolveu compartilhar comigo. De cabelos lisos, suaves e partidos ao meio, segurava o capacete com as mãos e seus olhos castanhos fitavam profundamente os meus, como um convite para nos darmos essa nova chance e pularmos juntos.

Antes mesmo de saltar, olhar pra ele já me fazia sentir frio na barriga e sorrir com os olhos, enquanto ecoava Bethânia no meu subconsciente cantarolando prudência, porque quem já se feriu presta mais atenção. Ele largou o capacete no banco ao lado e abraçou minha cintura, passando a calma necessária para darmos novos e conscientes passos em direção à porta aberta do avião.

Pulamos.

Juntos.

Encarando a aventura, mas sem o tropeço da inconsequência. Acionamos o dispositivo e o paraquedas se abriu, permitindo-nos admirar a vista linda após o salto. Enquanto a física cumpre o seu papel com a resistência do ar, a estética da natureza nos permite compartilhar o momento único e o otimismo pela leve descida nos conduz à tranquilidade de um pouso seguro, seguido de um longo abraço e de caminhos que pretendem seguir lado a lado.

Em um parêntese, de um outro dia qualquer presa em meus pensamentos, certa vez refleti profundamente sobre o que é uma tautologia: uma proposição que é sempre verdadeira, em absolutamente todas as variáveis. Se me permitem um clichê tautológico, abrir o coração para um novo amor é correr riscos, sem saber exatamente como será o pouso, mas apostando no otimismo do abraço após o choque de dopamina do salto.

Aqui embaixo, abraçada agarrando a cintura dos 1.84m que apoiam carinhosamente o maxilar no topo da minha cabeça, meu coração está acelerado pelo salto, mas surpreendente calmo pela escolha que fiz. Tiramos todos os apetrechos de segurança, fomos até o carro e rumamos na viagem de volta até São Paulo. Liguei o som e começou a tocar Summer ’68, do Pink Floyd, no Spotify, o suficiente para seguirmos em um silêncio confortável e íntimo, que confirma nossa acertada decisão de saltar.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

Silhueta

Com o carro em movimento em linha reta, percorríamos um caminho de conversa em curvas sinuosas, que deixei virar um monólogo quando voluntariamente silenciei para ouvi-lo falar sobre as charmosas copas das árvores de Belém em 1932, um grande paradoxo com os descuidados que assolam a Belém da COP30. A visão turva causada pelas vezes em que acendemos o isqueiro criava um delineado em tons escuros ao redor dele que, tentando dividir a atenção entre a rua vazia e sua interlocutora, dirigia com uma mão enquanto gesticulava com a outra.

A silhueta marcava o cabelo liso partido ao meio (cujos grisalhos, imperceptíveis no escuro, não me passaram batido sob outras luzes), o maxilar com a barba recém-tirada e desenho do queixo bem marcado (bem sentido, se em contato com a minha pele) e o característico sorriso de canto – seguido de um dar de ombros sutil e um barulho de tic – ao final de frases inteligentes e bem concatenadas. Ainda calada, torcia para ouvir mais sobre aquelas indignações com as copas das árvores que acusam o contraste entre o que somos e tudo o que poderíamos ser, comparando o vídeo de uma Belém que não mais existe com a que jamais existirá (porque é injusto, até para uma cidade, morar nas expectativas de amor alheias).

É nessa lacuna que fica a realidade: da cidade e de nós mesmos. É nessa lacuna, também, que encontramos algumas nuances do personagem.

De uma Belém que, embora esquecida, é inegavelmente charmosa quando passamos pelo túnel de mangueiras da Avenida Nazaré, cujas gotas de chuva em formato de luzes de Natal nos conduzem ao Can e ao entrelace das nossas infâncias escolares naqueles arredores, inclusive com a reverência ao Sagrado (seja às crenças cristãs e populares, seja à culinária na esquina da Avenida).

Dos interlocutores que, embora narrem publicamente alguns centímetros de história na superfície, resolveram se despir dos estereótipos a eles designados, para mergulhar nas profundezas das mútuas incoerências. Na fluência da conversa vieram os influxos de pensamentos, inclusive sobre o que ainda não se sabe, com a tranquilidade de poder desnudar nossas ideias sem medo, sob a sobriedade de uma água de coco na praça à noite após um dia de trabalho, ou naqueles momentos em que o vento se arrasta sorrateiro e perigoso arrepiando os pêlos dos braços.

Poderia passar horas a fio escutando os bonitos subtons de cor que estão sendo apresentados a mim, cujas diferenças, quando postas na mesma paleta, formam um curioso e impressionante pout pourri de personalidade. Desde o Raio-Que-O-Parta e do sushi feito de peixe amazônida, até as potencialidades do empresariado regional, tudo dito e argumentado com uma voz rouca irresistível e educada, dando a ênfase de quem verdadeiramente acredita que as copas das nossas árvores poderiam ser mais bonitas. Histórias contadas por olhos que já viram consideravelmente o mundo, mas que, por ou apesar disso, não deixam de ver Belém.

São esses olhos castanhos que quero fitar em silêncio, ouvindo o que eles têm a dizer durante o tempo que ainda tenho por aqui, admirando as linhas que dançam pela silhueta enquanto o carro está em movimento e a boca sente mais sede que o habitual, torcendo para que a noite tenha mais horas do que as que o relógio pode contar, até que a vida seja gentil e nos oportunize o próximo quando.

domingo, 15 de dezembro de 2024

Esotérico

Todas as consultas que fiz ao tarot erraram. Não sei exatamente no que acredito, mas tento me apegar a qualquer informação aleatória sobre o futuro, porque minha ansiedade não me permite ter a calma necessária pra esperar pra descobrir. Foi assim que fui atrás de saber o que o tarot tinha a dizer sobre aquele evidente perigo que estava sentado à minha frente, usando camisa básica escura e falando sobre histórias e ambições que eu esperava serem de autoria do homem que um dia imaginei como o da minha vida (o que eu não sabia, é que estava sendo apresentada a uma nova história, cheia de reviravoltas).  

Acontece que, como nem tudo são flores, diante da iminência do adeus não havia outra resposta senão o não definitivo, ainda que no meio disso fosse possível enxergar tantos aceites mútuos. Nos meses anteriores ao dia em que efetivamente o encontrei, por aventura e curiosidade consultei o oráculo e a resposta foi bem clara ao me preparar para o que viria pela frente: caminhos fechados para o amor no ano que viria. Quando o conheci, ciente do que me adiantou o oráculo, escolhi viver o momento, sabendo que ele terminaria e seria só uma boa memória. Só que quando a gente resolve mergulhar tão profundamente no agora, e o agora tem um sorriso tão bem desenhado e úmido de cerveja como aquele do outro lado da mesa, é muito difícil aceitar simplesmente voltar para a terra firme. Verdade seja dita, desde o primeiro dia, eu já estava perdida.

Foi aí que, balançada, procurei a resposta no tarot, na esperança de que o sinistro me adiantasse que haveria uma reviravolta capaz de assegurar minha arriscada aposta. O tarot me avisou que era pra ir com calma, que não daria certo e que eu deveria me proteger. Só que, a essa altura, eu já estava despida e ofegante. Despida de medo (também de roupas), ofegante porque meu coração já acelerava ao vê-lo (e por todo o adjacente que sempre acompanhava a vista).

Resolvi assumir para mim que o misticismo estava absolutamente equivocado. Qualquer que fosse a força inominada do sobrenatural que me deu aquelas respostas, definitivamente estava errada. Se as veredas do amor não iam se abrir, escolhi com coragem desbravá-las. Se era pra eu ir com calma, resolvi pagar pra ver e viver tudo de uma vez. Desde a respiração tranquila ao pé do ouvido enquanto só se ouve o barulho do ventilador de madrugada, até jogar pelos ares os planos e refazer tudo do zero, tendo como ponto de partida uma única certeza: o que há de mais sobrenatural na vida é a conexão entre os seres humanos, e isso só acontece de verdade algumas vezes nessa nossa breve travessia.

Na iminência de acabar a areia que está escorrendo pela cintura da ampulheta, sinto o coração apertar de medo do porvir e da ausência. É como se o oráculo e o tarot sussurrassem debochadamente que me avisaram e eu me recusei a ouvir por pura teimosia e arrogância. Se conselho fosse bom, seria dado de graça. Mas paguei por ambas as respostas místicas e não acreditei nelas, porque apostei na completa neblina de um futuro que não conheço as linhas, tudo porque cresci escrevendo histórias de amor e acho que sou petulante o bastante pra driblar o destino e escolher como vou escrever a minha. No fim do dia, foi uma afronta ao que é invisível, embora o causo em si provoque riso se contado na entonação certa (que é, particularmente, minha especialidade diante da tragédia).

Todas as vezes em que estou com medo, tento convencer a mim mesma de que existem vários cases de sucesso; que hoje em dia não é tão difícil quanto antes porque agora temos novos artifícios; que um dia vai ser bonito de contar como a gente conseguiu mesmo que tenha sido tão difícil enfrentar uma ponta à outra do mesmo continente. Só que tropeço em dúvidas e esbarro em receios, esses que me fazem lembrar do que me disseram o tarot e o oráculo, mas tive a ousadia de fingir que não ouvi.

Às tantas da madrugada, sob o pretexto de trabalhar no sofá, acabei em mais uma daquelas vezes em que me perco nas palavras pra expressar o que dói, enxergando segurança apenas nas letras digitadas no teclado do computador (que é onde costumo me encontrar, para além de qualquer lugar no mapa, em que pese sempre perdida em meus devaneios). Até que nem tanto esotérico assim é o decidir, porque a escolha é sobretudo humana – especialmente quando já se desconfia que o caminho é uma emboscada, já que aí é simplesmente uma escolha burra, de quem sabe que vai sofrer, mas deliberadamente opta por rir na cara do perigo. Ao fim e ao cabo, torço pra que o amor seja mundano o suficiente pra que, no futuro, eu possa dançar diante das cartas de tarot, dizendo a elas umas poucas e boas por terem me causado todo esse alvoroço sentimental ao errar a resposta óbvia de que nós havíamos nos encontrado para não mais nos desencontrar. Danem-se os astros, os autos, os signos, os dogmas, o oráculo e o tarot... Serás o meu amor, serás, amor, a minha paz... ou, para minha sorte ou azar, talvez o transcendente e estivesse certo sobre meu tiro no escuro.

sábado, 7 de dezembro de 2024

Deveras

 

Como grande entusiasta dos amores espontâneos, tenho acompanhado de perto o desenrolar de algumas histórias que, aos olhos comuns, seriam simplesmente imprudência. Por ver o mundo pelas lentes do possível, meus conselhos costumam vir acompanhados da torcida pela aposta no improvável, porque a vida só acontece à flor da pele quando acompanhada de shots de coragem.

Às vezes a gente dá mais sorte no amor que nos jogos de azar, embora nunca tenha me ocorrido sem precisar lidar com o prejuízo e juntar os cacos depois. Carrego uma certa bagagem de experiência de campo para dar às palavras o tom que elas merecem, porque as paixões que me descontrolaram são as que fizeram eu ser como sou...  Mas após apostar muito alto e perder de lavada, cheguei à conclusão de que meu papel deve ser escrever sobre o amor, e não protagonizá-lo, porque quem já se feriu presta mais atenção. Compartilhei essas conclusões pela primeira vez durante uma conversa no bar tradicional que fica na esquina da Ipiranga com a São João, para onde levei um encontro que precisava conhecer o charme do Brasil e uma boa caipirinha.

Enquanto ríamos das histórias um do outro, vestindo nossas respectivas personas de primeiro date, ele perguntou como uma mulher como eu poderia continuar solteira. Dentre as múltiplas respostas possíveis, respondi que sou entusiasta dos amores espontâneos e inesperados, mas que não são pra mim. Escrevo sobre eles, dando toques de ficção às histórias que pessoas envolvidas pelos brilhos nos olhos e pelo tesão das primeiras vezes me contaram. Queria ter a coragem de viver a intensidade de Bethânia, que prega a prudência, mas se permite eclipsar da realidade depois de ter você. Como animal arisco domesticado esquece o risco, decidi covardemente não ser domesticada e me proteger entre as folhas de word, disposta a escrever sobre as intensas histórias alheias, mas jamais me entregar novamente à possibilidade de não dar pé.

Existe um certo desconforto no vácuo do quase, e um medo avassalador de nunca mais conseguir escrever com a mesma emoção das vezes em que fui arrebatada ao ponto de enxergar e efetivamente compreender cada verso de olha. Daquele jeito que o texto flui tanto quanto os beijos que deslizam entre a boca e o pescoço, quando no durante; ou quando as palavras saem com tanta facilidade para o teclado do computador quanto as lágrimas que escorrem pelas maçãs do rosto, quando no depois.

Muito embora escrever seja essencialmente treino e técnica, não é recomendado ao cronista descolorir-se ao ponto do texto perder o carisma; Ou do amor perder a esperança; Ou da prosa ficar insossa sem a idiotice do frio na barriga. Escrever é ativar o modo deveras sobre a vida, sob pena de se limitar a transcrever de forma oca o alheio. Da língua à Língua, tudo o que já coloquei no papel passou pelas nuances das mais absurdas utopias da mpb, que me fizeram acreditar naquela sensação de finalmente ter encontrado ou fatalmente ter perdido, tudo isso transformado em melodia pelas conhecidas vozes dos imortais que verbalizam a poesia brasileira sob o som dos acordes de violões de nylon.

Enquanto pensava sobre tudo isso, respondi à pergunta feita, mergulhada naqueles olhos verdes enquadrados pelos óculos também verdes (minha cor favorita), e na esquina mais musicada de Sampa: continuo solteira porque sou entusiasta dos amores espontâneos, mas decidi apenas escrever sobre eles e não vivê-los.

Paradoxalmente, lamentei porque era provável que não nos víssemos mais, já que muito em breve ele embarcaria para Roma; analisei todos os detalhes do cenário e dos tons de verde que ele usava e que se embaraçavam com a natureza; pensei em transformar em texto a caipirinha na esquina da Ipiranga com a São João, a caminhada no fim de tarde pelo Ibirapuera enquanto o dia quente dava espaço para o sereno do entardecer, o beijo em frente ao lago do parque e ao som do nado dos cisnes negros que faziam uma arruaça qualquer. Respondi à pergunta sabendo que escreveria sobre todas aquelas memórias fotografadas com o olhar, porque transformar a vida em prosa é inerente ao hábito de observar e, naquele dia, tive a sorte de reunir bons detalhes (do derredor, do devir e da minha derradeira contradição).

domingo, 27 de outubro de 2024

Todavia


É domingo e as crianças brincam na chuva, no meio do bairro da Bela Vista. Escuto os gritos e as risadas, e de certa forma me sinto satisfeita por saber que ainda existe esse tipo de vivência, a despeito de São Paulo. Enquanto isso, encaro minha xícara de café de cápsula, tentando calcular há quanto tempo não passo um café pelo coador de verdade.

Com a dor me deparo, antiga aliada dos remédios que controlam meus súbitos porquês e velha conhecida. Sempre mais dura quando na frente da tela em branco com letras profundamente minhas sendo escritas, embora nesses momentos fluam mais bonitas e eternas, como são as palavras guardadas na intimidade e aquelas que evaporam na lembrança.

Respiro fundo e tudo está igual, apesar de cada todavia. Andando pela rua dia desses, quase adotei um cachorrinho em uma feira, mas me contive para poder pensar melhor; quase comprei um tênis superfaturado que namoro há mais de ano, mas fiz as contas e decidi deixar pra depois; quase aceitei menos que mereço, mas dei um passo atrás para seguir adiante. A cada quase que me aparece, percebo que venho sendo cercada pela esperada maturidade dos quase trinta, que nada tem a ver com covardia, mas sim com a coragem de me permitir escolher. Eu poderia fazer todas essas coisas, simplesmente porque quero, posso e estão ao meu alcance, mas desisti logo antes, pela velha máxima de que cada escolha carrega uma bagagem de consequências (e minhas bagagens têm sido pesadas já faz um tempo).

Olho para a parede branca decorada com novos quadros e tudo está igual, num infeliz paradoxo. Lá fora as crianças continuam soltando risadas agudas enquanto brincam na chuva; as pessoas continuam correndo entre as baldeações do metrô; eu continuo preocupada porque amanhã é segunda-feira e já encarei minha to do list; a louça continua acumulada, enquanto tento dar um jeito no restante da faxina da casa; os passarinhos continuam cantando, sufocados pela poluição como se fossem fumantes incorrigíveis; várias reticências, que implicam na continuidade infinita de tudo o que já é, sem nada a acrescentar, porque não existe infinito mais um.

Todavia, tudo por aqui, embora igual, está bem diferente. Não adotei o cachorro, não comprei o tênis e não aceitei. Não há dúvidas de que esse processo terapêutico que todo mundo fala tem funcionado (mesmo aos trancos e barrancos) na minha cabeça bagunçada e que há muito perdeu o fio da meada. O lado bom de tudo isso é que, a cada novo arco do personagem, os espectadores acham que era um cliffhanger. Todavia, devo confessar que não é, apesar de ser um ótimo recurso narrativo.

sexta-feira, 9 de agosto de 2024

Ampulheta

 

No parque, à noite, resolveram caminhar para tomar um vento no rosto e conversar sobre a vida depois de um dia que poderia ter sido qualquer, mas não foi, pelas intercorrências costumeiras da rotina cosmopolita próxima à baleia de metal. Entre as árvores e sob da lua, durante desabafos, confidências e sinceras trocas de olhares, repartiram muito mais que um sanduíche natural e uma garrafa de suco de laranja, para remediar as longas horas sem comer e fugir da gastrite que persegue aqueles à beira dos trinta que esquecem das refeições e abusam do café espresso sem açúcar.

Existe muito mais no cuidado do que se pode confessar, e nos atos de serviço moram palavras de amor que ainda não nasceram, mas parecem prestes a, embora sobrevivam ao segundo presente, seguindo à risca o combinado de se aterem às recordações criadas e datadas. Às risadas leves. Às noites não dormidas. Às manhãs recém iluminadas pelo sol. Às tantas outras coisas quantas podem ser construídas enquanto a areia cai suavemente pela ampulheta que o destino surpreendentemente preparou.

  O vendedor ambulante passou sorrindo e cantando, oferecendo o brigadeiro meio amargo que vendia para ajudar a família. Cantarolando uma música de letra improvisada, acusou em voz alta o que estava nas entrelinhas de cada fala, abraço e beijo: o jeito dos dois se perceberem, ali, é diferente. Atípico como os anos bissextos. No balanço das árvores de uma noite quente, em frente ao lago, existe inegável química na surpresa que dança ao som das palavras musicadas e inventadas pelo homem desconhecido, que sensível e sutilmente notou haver se deparado com uma possível raridade entre as tantas histórias de amor que já ocuparam a tinta gasta pelos mais sonhadores poetas.

Acontece que o que se entrelaça à melodia da canção inventada é a trilha sonora de La La Land, representada pela infusão de cores primárias e pelo carinhoso adeus para se viver os próprios sonhos, tão belos quanto todo e qualquer romance, inclusive aqueles que viram prosas escritas de madrugada e inspiradas pelos flashbacks dos momentos já vividos. Who knows? I felt it from the first embrace I shared with you. Tão intenso quanto a valsa no planetário é o olhar fixo sob a lua minguante, seguido pelo sorriso desconsertado por ter se perdido no diálogo enquanto observava algo qualquer nela em silêncio.

Durante um longo suspiro após cuspir nos pixels as palavras que estavam entaladas, não há mais o que ser feito, senão agradecer aos astros pelo alinhamento dos planetas que proporcionou o (re)encontro, nesta ou em qualquer outra vida, para este ou qualquer outro capítulo. Agradecer, especialmente, pela areia que já escorreu pelo funil e pela preciosidade que ainda está na parte superior e que promete incríveis desdobramentos ao futuro próximo que, apesar de transitório, há de ser especial.

Especial nos silêncios confortáveis, na partilha da vida, nos bons dias antes das reuniões corporativas, nos dentes escovados simultaneamente em frente ao espelho do banheiro, nas mensagens dessincronizadas, nas risadas bobas antes de dormir, na tranquilidade de repousar a cabeça nos ombros um do outro acolhidos pela fusão do abraço, na preocupação mútua e genuína, no café espresso com essência de coco pela manhã, na camisa discretamente amarrotada e acompanhada pela tímida justificativa, na busca por experienciar e conhecer os mundos um do outro, no compartilhamento de playlists antigas disponíveis no ar retrô dos CDs, no cochilo durante o filme bom em casa, no riso contido durante o filme ruim no cinema. Em tudo e em tanto, no entanto, a despeito do escorrer da areia. Ou talvez justamente por ele. Ou talvez simplesmente não se saiba, mas que tudo isso antecede algo, é quase certo que sim, mirando em cheio naquelas específicas palavras que flertam com memórias doces e especiais, independentemente do porvir, mas que ficam marcadas justamente por aquilo que foi e é bom. A vida é efêmera, permanente é a memória.