segunda-feira, 20 de maio de 2024

Lençol de elástico

 

Esticada no colchão feito uma estrela-do-mar, eu tentava encaixar as quatro quinas do lençol de elástico, após ter falhado miseravelmente ao tentar vestir uma ponta de cada vez. A cena era tão vergonhosa quanto cômica, mas por sorte eu era observada, no máximo, pelas formigas que de forma astuta sobem e descem as paredes do apartamento. É possível fazer muitas posições sedutoras em cima de uma cama, mas a posição estrela-do-mar certamente não está no kama sutra.

Foi naquela briga vexatória com o lençol de cama que caí em mais um buraco negro de reflexões aleatórias e estapafúrdias, típicas de uma mente ansiosa que se movimenta na velocidade da luz. A verdade é que, com base em uma pesquisa empírica cujo espaço amostral foi cuidadosamente delimitado, minha hipótese foi confirmada: ninguém sabe dobrar lençol de elástico.

Nesse momento, provavelmente algum leitor bem confiante deu de ombros e pensou que sabe, sim. É exatamente aí que eu afirmo – sem medo de errar – que ninguém sabe dobrar lençol de elástico. Não com perfeição, pontinha com pontinha, sem deixar qualquer vestígio de fingimento daqueles que a gente faz de conta que cumpriu a tarefa direito, quando na verdade só entregou por entregar.

Quando chega o humilhante momento de encaixar o lençol no colchão, a sensação é a de resolver um cubo mágico pulando de para-quedas: até que é possível, mas é coisa de maluco. Uma tarefa doméstica tão simples, gastando tantas linhas em uma crônica debochada? Inevitável para quem vive de metáforas banais.

A gente até consegue encaixar três pontas do lençol, mas fica aquela quarta solta, enquanto a gente sobe no colchão e se estica como uma lagartixa pra alcançar o outro vértice com a pontinha da mão, aí o canto do pé esquerdo, que estava encaixado, se solta subversivamente, como quem se recusa a cumprir uma ordem simples.

É como tentar equilibrar todos os cenários da vida: enquanto vai tudo bem com as amizades, o trabalho e a vida amorosa, a alimentação e a saúde desandam. Daí a gente tenta arrumar a saúde se matriculando em mais uma daquelas academias de grandes redes, na esperança de que iremos frequentar quatro vezes por semana, beber três litros de água por dia e comer besteira só de vez em quando. Só que, na verdade, a gente acaba virando sócio oculto das redes de academia (oculto mesmo, com a frequência zerada e a mensalidade debitando todo final de mês), o tempo no transporte público atrapalha o preparo das marmitas semanais e a gente desiste de beber três litros de água por dia porque é um saco ir ao banheiro mil vezes a cada turno. Sobra tudo para o delivery e para a coca zero, porque essa idade chega para todos.

Mas é preciso meditar, pra colocar a cabeça em ordem; pegar sol, para não faltar vitamina D; ouvir as notícias de um mundo trágico em frangalhos, para não ficarmos alienados; cuidar da pele, para atenuar as marcas do tempo no futuro; colocar botox preventivo, para evitar as linhas de expressão; manter a casa limpa e arrumada, mesmo passando dezessete horas por dia na rua em dias úteis; economizar com pequenos gastos, para poder fazer grandes investimentos em azeite superfaturado...

Enquanto isso, ainda jogada na cama como uma estrela-do-mar, lembrei que toda essa ladainha era só sobre lençóis, mas acabei desviando a rota para minhas rotineiras inquietações e costumeiras falhas (como aquela do início dessa prosa, em que toscamente briguei com um pedaço de tecido). Após um pequeno desabafo não ensaiado, acabei de lembrar que preciso buscar a roupa na lavanderia, cortando, sem mais nem menos, qualquer coisa que eu pretendesse dizer aqui. A vida nessa megalópole costuma ser assim: a gente só sai corren