Todas as consultas que fiz ao tarot
erraram. Não sei exatamente no que acredito, mas tento me apegar a qualquer
informação aleatória sobre o futuro, porque minha ansiedade não me permite ter
a calma necessária pra esperar pra descobrir. Foi assim que fui atrás de saber
o que o tarot tinha a dizer sobre aquele evidente perigo que estava sentado à
minha frente, usando camisa básica escura e falando sobre histórias e ambições
que eu esperava serem de autoria do homem que um dia imaginei como o da minha
vida (o que eu não sabia, é que estava sendo apresentada a uma nova história,
cheia de reviravoltas).
Acontece que, como nem tudo são
flores, diante da iminência do adeus não havia outra resposta senão o não
definitivo, ainda que no meio disso fosse possível enxergar tantos aceites
mútuos. Nos meses anteriores ao dia em que efetivamente o encontrei, por
aventura e curiosidade consultei o oráculo e a resposta foi bem clara ao me
preparar para o que viria pela frente: caminhos fechados para o amor no ano que
viria. Quando o conheci, ciente do que me adiantou o oráculo, escolhi viver o
momento, sabendo que ele terminaria e seria só uma boa memória. Só que quando a
gente resolve mergulhar tão profundamente no agora, e o agora tem um sorriso
tão bem desenhado e úmido de cerveja como aquele do outro lado da mesa, é muito
difícil aceitar simplesmente voltar para a terra firme. Verdade seja dita,
desde o primeiro dia, eu já estava perdida.
Foi aí que, balançada, procurei a
resposta no tarot, na esperança de que o sinistro me adiantasse que haveria uma
reviravolta capaz de assegurar minha arriscada aposta. O tarot me avisou que
era pra ir com calma, que não daria certo e que eu deveria me proteger. Só que,
a essa altura, eu já estava despida e ofegante. Despida de medo (também de
roupas), ofegante porque meu coração já acelerava ao vê-lo (e por todo o
adjacente que sempre acompanhava a vista).
Resolvi assumir para mim que o
misticismo estava absolutamente equivocado. Qualquer que fosse a força
inominada do sobrenatural que me deu aquelas respostas, definitivamente estava
errada. Se as veredas do amor não iam se abrir, escolhi com coragem desbravá-las.
Se era pra eu ir com calma, resolvi pagar pra ver e viver tudo de uma vez.
Desde a respiração tranquila ao pé do ouvido enquanto só se ouve o barulho do
ventilador de madrugada, até jogar pelos ares os planos e refazer tudo do zero,
tendo como ponto de partida uma única certeza: o que há de mais sobrenatural na
vida é a conexão entre os seres humanos, e isso só acontece de verdade algumas
vezes nessa nossa breve travessia.
Na iminência de acabar a areia que
está escorrendo pela cintura da ampulheta, sinto o coração apertar de medo do
porvir e da ausência. É como se o oráculo e o tarot sussurrassem debochadamente
que me avisaram e eu me recusei a ouvir por pura teimosia e arrogância. Se
conselho fosse bom, seria dado de graça. Mas paguei por ambas as respostas
místicas e não acreditei nelas, porque apostei na completa neblina de um futuro
que não conheço as linhas, tudo porque cresci escrevendo histórias de amor e
acho que sou petulante o bastante pra driblar o destino e escolher como vou
escrever a minha. No fim do dia, foi uma afronta ao que é invisível, embora o
causo em si provoque riso se contado na entonação certa (que é,
particularmente, minha especialidade diante da tragédia).
Todas as vezes em que estou com
medo, tento convencer a mim mesma de que existem vários cases de
sucesso; que hoje em dia não é tão difícil quanto antes porque agora temos
novos artifícios; que um dia vai ser bonito de contar como a gente conseguiu
mesmo que tenha sido tão difícil enfrentar uma ponta à outra do mesmo
continente. Só que tropeço em dúvidas e esbarro em receios, esses que me fazem
lembrar do que me disseram o tarot e o oráculo, mas tive a ousadia de fingir
que não ouvi.
Às tantas da madrugada, sob o pretexto de trabalhar no sofá, acabei em mais uma daquelas vezes em que me perco nas palavras pra expressar o que dói, enxergando segurança apenas nas letras digitadas no teclado do computador (que é onde costumo me encontrar, para além de qualquer lugar no mapa, em que pese sempre perdida em meus devaneios). Até que nem tanto esotérico assim é o decidir, porque a escolha é sobretudo humana – especialmente quando já se desconfia que o caminho é uma emboscada, já que aí é simplesmente uma escolha burra, de quem sabe que vai sofrer, mas deliberadamente opta por rir na cara do perigo. Ao fim e ao cabo, torço pra que o amor seja mundano o suficiente pra que, no futuro, eu possa dançar diante das cartas de tarot, dizendo a elas umas poucas e boas por terem me causado todo esse alvoroço sentimental ao errar a resposta óbvia de que nós havíamos nos encontrado para não mais nos desencontrar. Danem-se os astros, os autos, os signos, os dogmas, o oráculo e o tarot... Serás o meu amor, serás, amor, a minha paz... ou, para minha sorte ou azar, talvez o transcendente e estivesse certo sobre meu tiro no escuro.

