Com a pouca bagagem de experiência de vida dentro da
mochila, ao encarar os desvios do caminho, muito medo sente ao fazer escolhas e
se arrepender depois, como todas as outras vezes em que teve que fazê-lo. A
ânsia de se aventurar pelo sucesso e o medo desesperador do fracasso a fazem
dar sangue, suor e lágrimas para alcançar seus sonhos. O grande temor,
entretanto, é se, ainda assim, não alcança-los.
As chances de dar errado são tão maiores que a
probabilidade de dar certo, assim como qualquer deslize é capaz de colocar tudo
a perder. Ao deitar a cabeça no travesseiro, um turbilhão de pensamentos e
possibilidades inesgotáveis invade a pequena cabecinha de uma jovem que começa
a dar os primeiros passos.
É como o medo antes de arrancar o primeiro dente de leite,
misturado à ansiedade de receber um dente definitivo que, uma hora ou outra,
vai nascer bem no lugar do dente que caiu. No fundo, ela cogitava a
possibilidade de o dente definitivo nunca nascer e continuar banguela pra
sempre, apesar de ter grandes esperanças em um dente novo e forte.
Por muito tempo, dedicou às palavras a responsabilidade de
expressar o medo de crescer, isto é, do nascimento dos primeiros dentinhos. Agora,
que grande (um grande pequeno, de fato) está, dedica a elas a incumbência de
expressar o medo de não ser o adulto que sempre almejou ser, de não conquistar
os sonhos que cultivou, os planos que formulou, as metas que estipulou. De,
enfim, não ter um belo sorriso.
Crescer é, caso necessário, usar aparelho ortodôntico para
consertar os dentes que por ventura não ficaram no lugar certo, ou simplesmente
aceita-los do jeito que nasceram e se adequar a eles. Crescer é um conjunto de medos, erros e
acertos, todos misturados na mesma atitude, se bobear.
Nem sempre o dente sai quando a mãe amarra o fio dental e
puxa. Às vezes, a fada do dente não faz o seu papel e o dente teimoso não
amolece o suficiente, de modo que é necessário ir ao dentista para tirar o
dente de leite antes que o permanente nasça e empurre o antigo para onde não
deveria.
Essa é a perfeita alusão a quem está passando pelo verbo “crescer”
no gerúndio. Alguns dentes de leite já caíram, alguns provisórios já nasceram,
entretanto, um ou outro provisórios teimam em ficar, quando na verdade já
deveriam ter dado o fora. Enquanto a criança quer que o dente caia logo, tem
que lidar com o medo do dentista e daquelas máquinas com barulhinhos que dão
aflição em qualquer um. Esse é o exato momento em que as responsabilidades
empurram para fora o ímpeto jovem de ignorá-las enquanto ainda dá tempo.
Após a retirada do dente, a jovem lida com o espaço vazio,
o sorriso banguela exibindo a fase adulta recém-adquirida e a ansiedade pelo
nascimento do dente novo. O medo (sempre, sempre medo) de que ele nasça torto e
depois tenha que arrumar. Depois que ele nasce, ela se acostuma e as novas
responsabilidades passam a ser apenas mais uma parte do cotidiano, embora a
espera pelo nascimento do novo dente seja sempre uma pedra no sapato.
Aos poucos dá adeus à menina que foi e paulatinamente
reconhece que crescer é muito mais do que apenas trocar os dentes provisórios
pelos definitivos, também é cuidar dos definitivos: escovar, passar fio
dental... Mas o que está escrito aqui não é sobre odontologia, tampouco sobre
cuidados dentários, como é possível perceber facilmente. Não reparem o sorriso
banguela, ela também ainda está se acostumando com ele. Futuramente, se tudo
der certo nessa primeira troca de dentes, falaremos sobre sisos.
