Queria ser perigosamente misteriosa, indecifrável, opaca. Queria ser um mapa do tesouro dentro de um labirinto místico, onde o tesouro seria meus sentimentos guardados numa caixa e, ironicamente, o labirinto nunca deixaria ninguém alcançá-la.
Queria, sim, ser difícil de entender, porque essa vida de transparência não tem a menor graça. Queria estar sempre na contramão do que é previsto. Queria dar um baita trabalho pra qualquer cartomante. Queria ser boa com blefes, saber flertar, saber fingir, ou fingir sem saber que aquilo tudo era mera atuação de uma mente confusa.
Queria surpreender, saber chegar sem avisar, sem hora marcada, sem antes ter combinado, e, mesmo assim, ser recebida por vivas. Queria que meu olhar fosse um imã. Queria ser irresistivelmente misteriosa, a ponto de nem eu mesma conseguir decifrar minhas emoções.
Queria despertar a necessidade de conhecimento apenas pelo sorriso. Queria falar por enigmas e responder perguntas com outras perguntas. Queria ser um prato bem temperado, apimentado. Queria ser um banquete de comidas exóticas, sabores novos e frutas afrodisíacas, ao contrário, eu não passo de arroz branco: sem graça, sem cor e só fica bom se estiver acompanhado por algo melhor.
A verdade é que sou tão clara, mas tão clara, que chego a ser translúcida. Sou como água: inodora, insípida e incolor mas, diferentemente da água, não sou essencial. A emoção da surpresa está em falta. Sou tão previsível que a curiosidade fica entediada. Todos ficam entediados (até eu). Gostaria muitíssimo de não ser a personificação do tédio. Sou tão transparente que até um completo desconhecido saberia meu próximo passo. Minha personalidade carece de uma coisa: sal.