segunda-feira, 18 de julho de 2022

Garça da crônica

Hoje, sozinha, saí pra ler o pôr-do-sol e ver umas crônicas. Sentei em um banco qualquer na Casa das Onze Janelas e comecei a ler as pessoas. Vários casais apreciando drinks e ouvindo o saxofonista dar seu show, alguns jovens que estavam ali só por estar (como eu), debutantes fazendo fotos... Uma leitura de cenário que a gente só tem quando se põe a observar o qualquer. Em um dado momento, uma mulher desconhecida pediu meu banco emprestado, pois a mãe dela completaria 80 anos e estava fazendo um book. A senhorinha chegou, toda garbosa, fazendo poses e dando risadas, comemorando as oito décadas de vida. Olhando a cena, ri junto com aquelas mulheres. Achei tão afetuosas a senhorinha, a fotógrafa e a filha, que, de certa forma, senti que fazia parte do momento só por ter emprestado meu banco. Valorizei demais a vida, bem ali, com o sol das 17h ardendo nas costas. Pedi para a mulher desconhecida tirar uma foto minha, porque também queria registrar a bonita tarde. Ela virou pra mim e disse: roda (fazendo círculos com o dedo indicador). Apesar de me sentir um pouco idiota, comecei a rodar e rir para a desconhecida. Ela devolveu meu celular, agradeci, e foi embora. Voltei ao banco e à geração dos "Sabiás da Crônica", que pavimentaram o caminho dos cronistas, embelezando o corriqueiro com a bohemia carioca. Pedindo licença à minha modéstia, gostaria de dizer que hoje me assumi "Garça da Crônica", por narrar timidamente a bohemia belenense em versiprosa (apesar de não ser lida). Se vocês me perguntassem qual é meu sonho de vida, diria que é ser cronista. Acabei como professora de processo civil e advogada, mas tudo bem... Tenho coração de literata. O sol se pôs por trás da nuvem, fazendo chincana com a minha cara, que saí só para vê-lo ("difícil ver o sol tocar o horizonte", disseram pelo meu whatsapp). Perdoei o sol, porque a tarde foi linda e a solitude é deliciosa que nem um pudim de café, como nas crônicas, em que "o extraordinário mergulha no cotidiano e o prosaico deságua no sagrado" (Augusto Massi, no prefácio do livro citado, que descobri pelo podcast da 451).


Texto escrito em 16/07/2022,

sobre uma tarde bonita em Belém do Pará.

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