Episódio 4
Dito e feito. Programa marcado,
todos no shopping às 19h30, rumo à patinação no gelo. Só faltava chamar o
esquisitão. Confesso que escolhemos patinação no gelo por um motivo muito
nobre: desincentivá-lo à comparecer no programa, é claro.
Olhando bem para o dito cujo, com
aquelas roupas folgadas, munhequeiras estranhas, fones rock'n'roll e cabelo de
Curupira (fora o vermelho, o menino não era tão esquisito assim), tínhamos
quase certeza de que ele não patinaria no gelo. Não sentiria vontade de ir e
inventaria uma desculpinha esfarrapada qualquer para Sophia.
Era sexta, tínhamos marcado
encontro na praça de alimentação, em frente à nossa lanchonete preferida. Dudu
chegou primeiro, depois eu, Marcos, e assim por diante, até chegar a maioria da
turma. Sophia foi uma das últimas a chegar e trouxe consigo uma companhia:
Maurício.
Não é que o menino estranho
resolveu ir? Talvez Sophi com sua conversa tivesse conseguido convencer aquela
estranha criatura de que fazer contato social às vezes poderia ser bom. O preto
predominava. Munhequeiras roxas, cabelo desgrenhado (como o de costume), tênis
sujo e calças folgadas. E em pensamento eu me perguntava: cadê a senhora sua
mãe que te deixa sair assim de casa, critura?
Hora de calçar os patins. Todos
ansiosos para desenhar o risco de seus passos no gelo. Entramos na pista e o
inesperado aconteceu: Mau sabia patinar. Aliás, humilhava todos nós com tanta
habilidade. E Sophia estava mais derretida do que gelo em país tropical, eu não
conseguia crer em ambas as coisas.
Desistimos de tentar boicotar o
novato e aproveitamos a patinação, já que era o que nos restava fazer. Eram
corridas para um lado, trenzinhos para outro, e de vez em quando uma queda
cômica para animar o pessoal. Sophi estava distante. Aliás, distante de nós,
próxima a ele.
Tudo se acalmou, estávamos estafados
de tanto patinar. A pista era grande e tinha uma parte em que faltava
iluminação. Típica pista de patinação no gelo de shopping de classe média.
Cansamos, sentamos e ficamos alí trocando uma ideia, conversando e rindo, como
sempre. Até que demos falta da estrelinha do time: Sophi. Olhamos em volta e
não a encontramos. Até que nossos olhos foram para o cantinho escuro da pista
de patinação: lá estava ela, com os lábios entrelaçados aos do novato.
Continua...
